domingo, 21 de dezembro de 2008

Slide Away

Ele não sabe o quanto me machuca quando deixa tudo passar assim, despercebido. Existem esses momentos em que a gente quer ir embora e não se trata nem de chamar a atenção daqueles que insistem em não nos compreender; a gente só quer ir embora. Se ver num daqueles filmes antigos, com um carro velho numa estrada, nuvens de poeira e música boa à toda altura. Ele não entende isso, sequer se passa pela cabeça dele isso. Essa incógnita me enche o saco, apesar de eu ver nela o grande diferencial. Se ele tivesse parado com seus acordes e acordasse um pouco para mim ou qualquer outra porcaria, sabe, mas às vezes parece que ele consegue ser pior do que eu nessa vida de se perder em outras dimensões. Eu me sinto dopada, me sinto num desses dias comuns, tipo madrugada de terça-feira, em que, por insônia ou pensamentos atordoantes, se passa a noite de olhos abertos, com uma caneca entre os dedos e pouca luz. A brisa noturna é de embriagar, entorpecer qualquer um. E eu não sei se sou eu quem não deixa os ponteiros do relógio seguirem seu destino - até que a bateria esteja completamente sem carga - ou se é ele, que enxerga tudo em tons monocromáticos. Pouco importa agora o contato físico: eu quero olho no olho. Esse jogo de indiferenças me agride, me agride como uma risada dada pelo tempo segundos depois de algum arrependimento. Me enche o saco essa porcaria de filme na televisão: o que eu quero com xerifes agora, que eu não tenho ninguém? Deitar na cama é tão perigoso, é como se ela me engolisse e me mastigasse com todos os meus defeitos. Dormir não é pra mim. Não é pra nós. Eu levantei hoje, achando que tinha despertado de um sonho, mas era verdade: ele só estava no meu quarto impresso numa foto. Nada de cheiro de jaqueta. Vou te dizer, ele tem cheiro de jaqueta. Jaqueta jeans. E isso me lembra as vezes em que, antes de sermos alguma coisa, eu esbarrava naquela jaqueta meio que de propósito. Ele sempre fora destraído, sempre fora de não entender as coisas óbvias. E, mesmo assim, tinha idéias ótimas e absurdas sobre as coisas que a gente geralmente não pensa. É uma porcaria ficar jogada na poltrona vendo como ele canta bem. Ele toca muito bem. E sempre com aquela jaqueta, caralho. E, pra ser sincera, eu não sei bem se isso é um desses momentos em que a gente quer ir embora. Eu tô cansada de tudo, cansada de como metade das minhas ações consistem em buscar explicações para as outras. Eu não tenho que me explicar quando só eu tenho interesse na minha biografia. Talvez seja meio deprimente encarar isso, mas é verdade. Foda-se o que aconteceu, ninguém quer ouvir a minha versão sobre como eu perdi o medo de escuro. Ninguém quer ouvir. Só se for a música dele, a maldita música dele, que eu não consigo parar de ouvir. E eu nem sei se ele sabe que eu penso essas coisas todas, mas eu também nem tenho como saber o que se passa lá enquanto estou aqui. Bem que eu queria me sentir turista daquele mundo, daquela cabeça, daqueles olhares silenciosos que me lêem sem responder. Eu já não sei se hoje é terça-feira, se ainda existe alguma caneca que eu não tenha atirado na parede, se... mentira, eu não atirei nada na parede. Eu não atirei nada na parede. E a jaqueta dele está aqui, por incrível que pareça. Ele é que não está. E, mesmo que estivesse, sentado na minha frente que fosse, eu não acho que ele estaria aqui inteiramente, sabe. Sempre em outra dimensão, ele está sempre do outro lado. Do outro lado e nunca do meu. A noite está boa, a brisa está boa e essa vai ser mais uma noite de insônia: ninguém pra me ouvir falar de como eu não entendo nada. Eu não pertenço a lugar algum.


"Slide away and give it all you've got
My today fell in from the top
I dream of you and all the things you say
I wonder where you are now
Hold me down, all the world's asleep
I need you now, you've knocked me off my feet
I dream of you and we talk of growing old
But you said: "please, don't!"
Slide in, baby - together we'll fly
I've tried praying, but I don't know what you're saying to me..."
Oasis



 

2 comentários:

anônimo? disse...

entendo perfeitamente o que vc quer dizer sobre madrugadas melancólicas..
não parece que sempre passa o mesmo filme na tv?
até ler fica dificil - no meu caso pelo menos - pq nenhum livro parece bom o suficiente pra espantar aquele sentimento de pijama, caneca na mão,e filme velho deprimente.

ah, sinto muito pela aparente perda do namorado - ou outra coisa - mesma que seja meio clichê dizer isso e eu nem te conheça.. mas realmente sinto

alias, adorei teu jeito de escrever, tem uma pitada de holden ( apanhador no campo de centeio)
ah, e ótima lista de livros ^^

n sei se faz diferença ou n, mas teu blog já está nos meus favoritos
e eu realmente pretendo voltar aqui =]

Ivy disse...

:D wow!

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