quarta-feira, 14 de outubro de 2009

the day after


hoje aconteceu uma coisa superchata, e eu fiquei pensando que amanhã será pior. o 'dia depois' é sempre pior. o dia depois de um assalto, de uma briga, de qualquer coisa que pareça definitiva e nos cause dor. a mensagem toda está só nessa idéia, assim mesmo, injustificada... não existe argumento: você dorme (tudo bem, rola na cama e não dorme direito - mas dorme) e acorda com aquela sensação de quem recém levantou do chão após levar um soco na cara. acorda e demora um tempo a mais para se situar no mundo. então, finalmente a cena do dia anterior começa a brilhar ativamente na consciência. arrependimentos à parte, a coisa toda é uma merda. é o tipo de coisa que não pode ser encarada com a mesma naturalidade com que um viciado em algo comemora a distância de seu vício. um dia a mais parece ser um dia a menos com o que supria nossa necessidade (nem sempre percebida até chegar o momento presente). fica claro que a realidade se faz da continuidade da vida, que planos são planos - têm condição parasita, necessitam de nossas ações para serem reais. e para se desfazerem também. é esse o verbo: desfazer. o dia depois é o dia do desapego involuntário, do luto amargo, da cobrança por uma atitude. arrumar o que se pode arrumar, esquecer o que não tem jeito. assim, sem traumas, sem floreios e poesia. a lei diz que o planeta não vai parar de girar, que tudo continua a ser o que era (ainda que em constante renovação). e, de repente, vem a não-sintonia, a vontade de pular para fora de tudo, mergulhar no vazio sentimental da perda, da esperança que embriaga e enlouquece, da razão pontiaguda. não se trata de pessimismo - é um fato: o dia depois é o pior. ansiedade, desconforto, pânico, medo, tralalá. e não é que depois a melhora seja notória e progressiva... mas, não importa, o dia depois é sempre o dia depois. o dia em que tudo se choca, em que o que era palpável se mostra inalcançável, em que entramos em conflito e ficamos revoltados com o que aconteceu no ontem e o que acontecerá no amanhã. é o dia em que o céu prepara o sol pra chuva que não quer vir, para a tempestade imprevista - e essa preparação simplesmente existe, sem consentimento ou previsão de um futuro bom. e a falta de pretensão, nessas horas, é o único e melhor remédio. esquecer, expulsar qualquer pensamento. qualquer esforço para se afastar é válido, mesmo que geralmente acabem sendo incapazes de produzir qualquer efeito positivo. enfim, o dia depois. a porcaria que é ter que acordar de uma noite de incômodo para presenciar o pesadelo. e é assim mesmo, bem trágico e por vezes exagerado. e nem por isso deixa de ser igualmente verdadeiro.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Orchard of my eye


Oh you, you are the orchard of my eye
I couldn’t help but re
cognize
You were standing in my way
And you, dream of rainbows in gray skies,
Couldn’t help but re
alize
I feel the way I do
When we fall, we’ll fall together in the end
Please don’t tell me I’m your friend
I am not your friend when you call
I’ll come stumbling to your side,
and by your side I will stay
They are the goons we shouldn’t fear,
Making faces breaking mirrors –
I wish that they’d just stay at home,
But while we’re on the outside looking in,
Let’s take pleasure while we can –
Because it’s coming to a head
When we fall, we’ll fall together in the end
Please don’t tell me I’m your
friend
I am not your friend when you call
I’ll come stumbling to your side,
And by your side I will stay
I am much more than your friend.


{ The Pains Of Being Pure At Heart }

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Gold Soundz

Ele parou o carro no posto de gasolina. Deixou o cara do posto enchendo o tanque e entrou na lojinha para comprar chicletes e coca-cola. Quando ele começou a se aproximar, eu fechei a janela do carro - deixei que o vidro escuro me deixasse quase invisível. Eu me sentia melhor assim, gostava de observá-lo sem que ele percebesse. Voltou com duas cervejas, os chicletes, a coca e uns três pacotes de bolacha. Pegou a chave com o cara e, uns segundos depois, estávamos de volta no asfalto. Durante a viagem, ouvíamos qualquer coisa. Digo isso porque nosso gosto era mesmo parecido. Músicas, livros, filmes e todas essas coisas que parecem dar mais sentido e personalidade às pessoas. Não exatamente tão clichê. A pretensão não era voltada para uma tentativa de fazer nascer qualquer porcaria de sentimento, apenas existia a intenção de aproveitar os acontecimentos. Se temos que viajar, que seja legal. Se queremos viajar, e queremos ir juntos, ok. Simplesmente ok. Estrada, noite, vento e música - nada errado. Eu sempre gostei de ficar olhando para o cabelo dos outros, mas, com ele, minha atenção sempre se voltava para sua barba enigmática. Eu falo isso porque nunca soube se ela era como era propositalmente ou por preguiça, acidente, qualquer outro motivo aleatório. Eu gosto de coisas inusitadas, e barba por fazer, e pessoas que se vestem bem porque realmente combinam com o que vestem (e não, necessariamente, porque combinam as peças ou coisa que o valha). Ele dirigia com uma mão na direção, falando besteira atrás de besteira. E como eu adoro besteira! O fato é que eu ri muito durante a merda da viagem. Aquelas seis horas passaram muito, muito rápido. Devo ter ouvido os melhores cd's do mundo e dito todas as coisas que me passaram pela cabeça. E, quando ele falava, eu ficava olhando a boca dele se mexendo. E pensando na barba, na maldita barba. E em todo aquele cabelo, que eu não hesitaria em bagunçar. Acho que uma das minhas marcas é despentear as pessoas. Tipo isso. E ele falava e abria tanto a boca, como se fosse comer o mundo com as palavras. E eu achava graça, eu sempre achei graça. Do lado dele, eu me sentia como uma música dos Pixies, um clipe de Killers, sei lá. Lost in Translation com o humor de Skins. Whatever. O fato é que madrugada combina com humor porco, e revelações, e todas as coisas sinceras e longe de serem avaliadas como certas ou erradas. Certos segredos só se vivem com estranhos. E é legal ter do seu lado uma pessoa de barba enigmática - ajuda a manter o ar impessoal. Eu me enrolei num casaco, encostei a testa no vidro e fiquei vendo as árvores se tornarem borrões no escuro. Sempre me pergunto o que eu faria exatamente se, do nada, estivesse do lado de fora do carro no meio do caminho entre uma cidade desconhecida e outra-que-sei-lá-qual-é. Ele me contou sobre suas férias de seis anos atrás, sobre sua relação com sua irmã, enumerou os defeitos da antiga escola e fez umas trocentas listas sobre todos os álbuns que eu tinha que ouvir. E me falou dos amigos, de como aprendeu a tocar baixo e todas aquelas histórias que eu gostava de ouvir repetidas vezes - apesar de ele raramente repetir alguma. Sempre tinha algo novo pra contar, uma nova porcaria que algum infeliz tinha feito. Eu gostava de fazer parte daquilo, gostava de estar ali comentando tudo abertamente. Trocávamos xingamentos e depois ele sempre me abraçava daquele jeito diferente. Grosseiro e afetuoso. E extremamente "dócil". Dócil é uma palavra estranha, mas se encaixa nessa situação. Por vezes, sentia vergonha por alguma grande merda que eu dizia. Daí, ele olhava pra mim com aquela cara de indiferença e dizia que eu tinha que agir assim mesmo. Grande merda mesmo. E, realmente, grande merda. Acho que as boas coisas realmente nascem daí, dessa espontaneidade, desse "eu sou assim mesmo" - que torna os erros apenas enganos passageiros (e pronto). Tudo é mais simples se é espontâneo, se ocorre naturalmente. Tudo cru. Cru. Cru é uma boa palavra, e é do tipo que ninguém fala ou escuta com muita freqüência - a não ser quem trabalha em uma cozinha. E eu sei lá se ele sabe cozinhar. Sei que a gente come qualquer coisa, como escuta qualquer coisa. Qualquer coisa, menos pastel de palmito com massa integral. Sabe, se eu for pensar bem, ele é organizadamente desajeitado. E eu adoro isso. Adoro pessoas que não parecem perfeitas e acabam se passando por isso justamente por serem exatamente como são. A gente dividiu a coca, acabou com os chicletes e se divertiu cantando rap e falando mal de quase todo mundo. Isso era uma coisa que eu admirava nele, esse "quase". A linha tênue entre o fazer ou não, que acabava silenciada no não. O silêncio, o silêncio dele era outra coisa que me intrigava. E, quando vencíamos a distância, e a barba se aproximava do meu rosto, eram seus olhos inusitados que me roubavam a atenção. E eu gosto de como grande parte da história é besteira, grande parte se resume em barba e cabelos e roupas. Nem só de subjetividade vive uma pessoa. O que é externo e visível importa, importa porque também agrada. E desagrada. E eu não sei se agrado. O fato é que eu continuo fechando a janela toda vez que ele se aproxima, numa tentativa de me esconder e poder observá-lo à vontade, livre da minha identidade e da responsabilidade de ser eu. Tem pessoas que me agradam tanto que, nem sei, me fazem querer estar por perto, mas escondida. Não seria insegurança. Talvez eu seja desajustada também. E grosseira, às vezes. Tanto faz, ele não se importa com essas porcarias. Ele é desses caras que fazem a gente ser a gente, defeituosamente a gente. E do jeito bom e lindo também.

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