sábado, 2 de maio de 2009

Dress

- Quer que eu o tire da manequim para você prová-lo? - A lojista pareceu surgir do ar - do invisível - sorridente e perfumada. Emily, que estava parada na porta da loja, de frente para o vestido, assustou-se com a quebra do silêncio, mas não despertou do seu momento de fantasia.
- Ahm? Não... - Deixou cair parte da mostarda do hamburger sobre a bolsa de lona que trazia à tiracolo. A moça uniformizada ofereceu um guardanapo e rapidamente buscou uma garrafinha de água mineral. Emily lambeu os dedos engordurados, terminando de comer seu almoço. Deixou-se encant
ar pelo vestido da vitrine. - É, eu quero experimentar... o vestido...
- Ele é lindo, não? Por favor, deixe suas coisas em cima do pufe! - Emily procurou uma lata de lixo em que pudesse atirar o papel sujo que envolveu o sanduíche. Acabou tendo que pedir que outra funcionária o fizesse. Cruzou os dedos e traçou seus passos em direção ao provador.
Pareceu infinitamente longa a tarefa de tirar a roupa e vestir aquela peça única. Tão branco. Tão puro e branco. Nunca tinha visto o branco com tanto interesse. Uma perna depois da outra, um pouco de alongamento para puxar completamente o zíper e eis que Emily se transformara numa noiva. Numa noiva descabelada, era fato, que mordia os lábios inferiores
e alisava os braços.
Virou de costas para o espelho, levantou os cabelos de forma a deixar nus ombros e nuca. Enxergou uma imagem que desconhecia, uma seriedade por detrás daquela brincadeira. "Vou casar de All-Star", pensou. E, em segundos, se deu conta do erro da frase. A idéia de criar laços eternos não parecia tão tensa - pelo contrário, se insinuava tão naturalmente... Engoliu em seco e virou-se de frente para seu reflexo. Olhou para seus pés pequenos e afastados, levantando a volumosa e pesada saia do vestido. "Sabe, até que eu daria um merengue bem bonito". Poderia e até gostaria da idéia de ter uma roupa como aquela.
Saiu do provador com um sorriso mudo, com uma felicidade triste: faltava o noivo para colocar em cima do bolo. O que, de fato, não era de todo mal: teria mais tempo para se preparar psicologicamente. Emocionalmente. Mais tempo para entender que pessoas sozinhas não conseguem suprir seu vazio interior, mais tempo para encontrar a música ideal, mais tempo para... Mais tempo.
Emily, que sempre passava por essas lojas de vestidos de noiva comendo um cachorro-quente ou algo que o valha, agora não se importava em tentar reprimir sua curiosidade. "Eu sou pra casar". E, de fato, todos são. Todos são...


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