- E essa ferida na boca?
- Eu me machuquei com papel-alumínio... fiquei mordendo um pedaço... uma hora ele escapou e eu acabei mordendo meu lábio.
- Hum. Que ruim, ein. Mas por que raios te deu essa vontade de comer papel-alumínio?
- Não distorça as coisas, eu não queria comê-lo... Enfim, foi vontade. Só vontade, sabe do que eu falo? Vontade das coisas.
- Vontade das coisas? Haha, você é tão engraçado. Que coisa de louco... comer papel-alumínio...
- Eu não vejo graça. Mas tudo bem.
- Ai, melhora essa cara. Que cara de bunda! O tempo todo é isso...
- Não é "cara de bunda", é só minha cara. Minha cara ao natural, sem esbanjar emoções.
- Mas assim é feio, você poderia ser mais simpático que isso...
- Eu poderia muitas coisas. Eu não tenho que fingir estar alegre.
- Fingir estar alegre? Vai me dizer que eu te deixo infeliz agora?
- Não, que pensamento mais... repulsivo. Não misture as coisas.
- Você tá sempre de cara amarrada, parece que não pode estar feliz comigo.
- Se você me deixar em paz talvez eu até consiga...
- Eu não acredito no que eu estou ouvindo! Quer dizer então que...?
- Não, não! Ah... fica quieta. Olha, te trouxe os pães que você pediu. O troco ficou com o cara do mercadinho, ele disse que você está devendo umas coisas...
- Ah, aquele mala! Eu disse que pagaria na sexta-feira.
- Que seja. Eu vou embora, depois você se entende com ele.
- Vai embora? Pensei que você fosse querer ficar pra janta, ver um filminho...
- Não tente me seduzir. Sabe, eu não estou com vontade.
- Não está com vontade?
- Com vontade de você. Não estou.
- Eu juro que pensei que você fosse um cara legal, sabe... quando a gente se conheceu você parecia tão melhor.
- Eu parecia tão melhor porque era o amigo do seu irmão mais velho. Isso sempre é meio afrodisíaco.
- Não, claro que não...
- Que seja. Mas você gostou de mim de cara por causa dessa idéia. Eu não tenho nada a ver com seu relacionamento com seu irmão, mas acho irritante sua mania de querer aparecer.
- Nossa, eu te dou a chave do meu apartamento e você me diz isso?
- Olha só, nós somos vizinhos. E eu te respeito, inclusive por consideração ao teu irmão.
- Mas...?
- Mas não quero. Não sinto vontade. A minha "cara de bunda" mostra isso, mostra que eu não sinto nada.
- Que coisa mais idiota. Eu não acredito que eu estou aqui parada com minha melhor calcinha para ouvir você me negando com uma explicação-merda dessas...
- Eu me sentiria constrangido só de estar "com minha melhor calcinha" e usando isso de apelo. Sabe, eu não vou te achar mais legal se eu ver sua bunda. Na verdade, seu comportamento todo é deprimente. Se eu fosse você morreria de vergonha e nem esperaria explicação nenhuma da minha parte.
- Que absurdo! ...Que absurdo, sério. Que abuso...
- Por favor, coloca uma calça e desliga esse rádio. Durma um pouco e se sentirá melhor.
- Me dá aqui essa chave! Você está proibido de entrar aqui, ouviu?
- Ok.
- Sério, por que essa cara? Não era pra você ficar alegre...
- Por favor, faça o que eu disse. A gente não se entende, não adianta. Eu não conto nada pro teu irmão, nem esquenta a cabeça com isso. Só fica longe de mim, sabe. Me deprimo quando você aparece no meu apartamento.
- Você fica o tempo todo sozinho, eu quero te fazer companhia!
- Não, você tenta... você só tenta me fazer companhia. Eu sou sozinho, é diferente. Você também é sozinha, mas suas amigas-cor-de-rosa disfarçam isso.
- Ai, sai daqui. Não suporto esse baixo-astral!
- Ok.
- Que merda, fala outra coisa! Eu não acredito que você está fazendo isso... Sabe, o dia que você resolver olhar pra mim eu vou estar com um cara muito melhor do que você.
- O seu conceito de "melhor" é semelhante ao que eu considero algo "ruim". "Suficientemente ruim", sabe? Sem cerimônia. Então, não vejo grande dificuldade em te tirar do seu cara perfeito, caso um dia eu tenha essa vontade.
- Vontade, vontade... isso é tão vazio, tão momentâneo.
- Eu sou vazio, sou temporário. Eu não sou essa "cara de bunda" que você acha bonitinha.
- Que merda, que merda! Que vergonha!
- Eu vou deixar você se vestir. De preferência, arranje outro alguém para te comprar os pães, ok? Não ando com muita vontade. Quando eu digo que não me importo em fazer esses favores é porque eu sinto que tenho que ser um pouco responsável por ti.
- Por causa do meu irmão?
- Também.
- Que merda.
- Pega sua chave. Eu não volto mais aqui, não essa semana.
- Mas volta outro dia? Volta?
- Se eu voltar, trarei um cd. Mas eu não tenho vontade de você, não se iluda.
3 comentários:
Muito Boa a história cara. Na verdade eu achei meio engraçado o final: Mas volta outro dia? Volta?
Mas sabe né que dificilmente nós homens recusamos uma guria com sua "melhor calcinha". Na verdade nem saberiamos da calcinha, mas enfim.
Ele age mais ou menos como se o Holden acabasse falando tudo o que ele pensa.
Olha, ali pelas 16:00, 17:00 - eu até posso ir na padaria, sabe...
aushasuhasuh
Tipo - eu achei tri, como todos - só que esse me fez rir bastante - eu vi umas cenas antigas na minha cabeça lendo esse texto, e me fez rir mais ainda...
E legal o ressaltar do: Eu te dei a chave do meu Ap.Tipo, bah, abrir as portas da sua casa, ou melhor, dar as portas pra alguém, é sinônimo de grande "Te quiero"...
asashuashusa
A moral, eu acho que o cara é apaixonado pelo irmão dela, é uma biata duma bixinha que tá ratiando na da guria - pronto falei!
ausuhashuas
Não não, na suma: Tá foda, como sempre!
beijosss
hahahaha
pois é, eu tenho essa mania de "pôr à prova" (nossa, não sei escrever isso) a masculinidade dos meus caras. hahaha sempre recusando sexo e dando umas desculpinhas cinzas psicologicamente de menininhas entediadas. haha :D
eu sei que na vida real é um pouco diferente, ainda mais quando se trata da 'melhor calcinha', mas né...
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