segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

sereia

faz tempo que não sei quem sou. esqueci de mim. apertei as narinas para dar um mergulho, mas não retornei à superfície. fiquei imersa na imensidão, no caos, na suavidade que amedronta. esqueci do mundo. e voltei sem entender ao certo quanto tempo tinha passado. às vezes, isso ainda acontece silenciosamente. sempre que eu retorno de um mergulho profundo, não reconheço meus dedos nem os fios de cabelos boiando ao meu redor. é como se eu sempre voltasse diferente. e dessa vez não tem sido uma exceção. não sei quem está ao meu lado. nunca soube. em nenhuma das vezes, tive certeza. certezas e pessoas não combinam, não formam um par. e o que mais me assusta é perceber que eu não me conheço suficientemente bem para entender todas as minhas motivações e justificativas. existe intenção, vontade, chuva de emoções. existe verdade, razão e sentimentos. existe o mar e todo o mistério que o envolve. tudo existe. não há o que não tenha sido inventado. me reinvento toda semana, toda quinta-feira, toda vez que encho a caneca de sucrilhos, toda vez que percebo meu rosto no espelho. e, cada vez que eu retorno e as dúvidas parecem ter se multiplicado, é inevitável me afogar. nem sempre o pé alcança o chão. nem sempre existe fundo.


7 comentários:

Holden disse...

Sinto como se tivesse abandonado meu corpo, ou talvez o tenha deixado parar trás em algum momento, como se nós tivéssemos nos tornado duas pessoas completamente diferentes, porque a pessoa que era e a que é hoje agiriam como dois estranhos um para o outro. É um momento estranho este na qual não se tem como identificar aquele rosto que te olha no espelho, ou aquela voz que sai de dentro da boca. Sempre achei que a vida era uma amante traída, mas hoje tenho a certeza de que o Tempo também o é. Não há nada pior para as pessoas, as relações, o universo do que o tempo. O maior e pior de todos os inimigos, aquele que irá vencer inexoravelmente, que irá destruir de uma forma ou de outra tudo o que se construiu. Não me admira então que nós como espécie sejamos tão mesquinhos, tão ávidos por conquistas efêmeras, já que possuímos aquela certeza de que dobrando a esquina tudo nos será tirado. Mas bem, eu divago.
É um momento deveras estranho, realmente, fico pensando se todas as pessoas passam por isso, mas se resignam pensando que é assim que os adultos devem agir. Seria interessante ver alguém próximo dos 30 anos surtando por não ter a menor ideia de como seguir em frente. Ao menos seria honesto.

Ivy disse...

Essa sou eu escrevendo pela terceira vez depois de ser trollada pela tecnologia, hehe.
Holden! Que surpresa boa. :) Espero que dure depois de virar a esquina.
Fiquei pensando queque, hoje, realmente não consigo pensar no tempo como um bom mediador ou remédio... Ele só faz esquecer. E o que fica se distorce.
Nunca pensei na busca desesperada por conquistas efêmeras dessa forma. Escrever três vezes, cada vez de um jeito diferente (porque não tive a brilhante idéia de copiar) me fez refletir bastante sobre a insistência com que me convidam para a adultez e minhas constantes recusas em me conformar, aquietar. Viver e mudar constantemente demanda mais energia do chatice. Adultos são mestres em chatice. Ou algo que o valha. Esquecem dos impulsos que nos fazem retornar dos mergulhos profundos e, na verdade, esquecem de mergulhar também. Só nadam. Viram professores de natação. Uns impostores, se você quer saber.

Anônimo disse...

Concordo com a parte dos impostores, porque no final das contas todos somos, até o final da vida, porque ninguém nunca sabe direito o que está fazendo e para onde esta indo. Só que algumas pessoas tentam parecer que estão sendo donas da situação enquanto outras tornam divertida a procura ou a falta de respostas. É interessante mesmo como existe esse convite, ou essa adequação que parece ser necessária após um periodo de vida. Uma fase nova, a qual tudo deve ser diferente, onde não mais se deve fazer certos tipos de coisas, onde a adultez se faz necessária e opressora, quando na realidade nada muda de fato nas pessoas. Não existe realmente uma nova fase. O que talvez exista é uma cretinice generalizada de pessoas que acham que devem estar fazendo algo errado ao não se encaixar com o resto dos adultos da rodinha de discussão que fala de Carpinejar, filhos e a reforma da cozinha. Descobrimos que existe agua em marte, mas ainda estamos discutindo as nudes do Stenio Garcia ou algo que o valha. Somos mestres nas cretinices ínfimas da vida. Dizem que a partir dos 29 anos de idade as pessoas deixam de experimentar e tentar coisas novas e ao me aproximar dessa marca eu só consigo pensar em como ainda me sinto com 17 anos de idade e não consigo ver isso como errado, enquanto outra parte de mim acha que tudo o que nós representávamos morreu e como eu sou cretino e cínico com o resto do mundo. Me sinto como uma tirinha do Calvin e Haroldo. "Uma pessoas simples, mas com gostos complicados".

Ivy disse...

Verdades. Me alegra poder concordar, mas não deixa de ser lamentável. Porque tudo o que nós representávamos morreu? Faz tempo que não leio obituários. Eu espero não sair dos 17, mas vejo as pessoas ao redor cumprindo as exigências da hipotética nova fase e parece que não há lugar seguro. Aos 17 eu pelo menos não me importava. Acho que sou cretina por achar que sou menos cretina. Me identifico com o que tu diz. Imagino que a ambivalência e o sentimento de inadequação serão constantes. Os últimos filmes que recordo mostram como se a adultez aflorasse como um click e fosse um momento de iluminação. Mentira.

Ivy disse...

Verdades. Me alegra poder concordar, mas não deixa de ser lamentável. Porque tudo o que nós representávamos morreu? Faz tempo que não leio obituários. Eu espero não sair dos 17, mas vejo as pessoas ao redor cumprindo as exigências da hipotética nova fase e parece que não há lugar seguro. Aos 17 eu pelo menos não me importava. Acho que sou cretina por achar que sou menos cretina. Me identifico com o que tu diz. Imagino que a ambivalência e o sentimento de inadequação serão constantes. Os últimos filmes que recordo mostram como se a adultez aflorasse como um click e fosse um momento de iluminação. Mentira.

Anônimo disse...

Talvez não seja realmente a melhor descrição dizer que "tudo o que representávamos morreu", o que mais se aproxima disso seria"tudo muda", ou se transforma, ou qualquer coisa similar a isso. O que é bastante natural, já que ficar estagnado também não seria bom, e me vem de pronto a analogia um tanto quanto batida de pedras que rolam. Não há como lutar contra a mudança, de uma forma ou de outra, pois se até aquelas pedrinhas que existem no deserto do atacama se movem com a força do vento, mesmo que milimetro a milimetro, nós também mudamos. O que não é também necessariamente ruim já que estar parado significa não aprender. De toda a forma eu concordo bastante com o que tu diz, não existe uma mudança brusca, não existe resposta, nada é pronto e não existe um botão, nem mesmo um mapa ou dica de como as coisas acontecem. O que me preocupa é o tanto de pessoas que acham que de alguma forma elas deveriam mudar. O tanto de pessoas ao meu redor que acham que chegou "aquele ponto na vida" onde tudo deve ser mais sério. Nossa geração já devia ter superado esse tipo de problema já que essa necessidade não existe mais. Somos um novo mundo, novas circunstancias, muito embora a humanidade continue cretina como nos tempos de Platão. Minha própria condição mudou, e por um longo periodo creio que não consegui estar em paz com tudo o que estava acontecendo. Meu Zen estava fora de lugar, mas pouco a pouco acho que estou conseguindo conciliar minha cretinice a uma nova condição de vida.

Ivy disse...

Vou escrever amanhã. Fez sentido pra mim justificar isso aqui. Tem sido boa essa troca de palavras. :)

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