Eu não te amo. E a recíproca é
verdadeira. E isso não deveria ser um drama. Se tem algo que a passagem do
tempo faz é limpar um pouco o romantismo das coisas. O cru é mais honesto. Já
basta o esforço diário para desempenhar um papel razoável no trabalho, no grupo
de amigos, no meio familiar. Voltar para casa, para o quarto silencioso, é
protetivo. Para mim e para quem precisa conviver comigo. E creio que seja o
mesmo para as outras pessoas. Depois da urgência típica da juventude, de quem
parece sentir o futuro distante - como se nunca se concretizasse -, vem uma
certa calma. Não chamaria de tranquilidade, mas de movimentos e intensidades
atenuadas. A rotina estabelece tédio e segurança. Toca o despertador na
segunda, na terça, já nem importa o dia. O conhecido é confortável, fácil de
acomodar. Também desacomoda, quando o sono não vem ao deitar. Dormir parece ser
um parâmetro adequado para avaliar o momento pessoal de cada um... Se o sono
chega antes que o corpo possa se ajeitar na cama é um sinal de que temos tido
pouco tempo para pensar, para ponderar sobre o ontem e o amanhã, que o impulso
tem prevalecido. Quando o corpo nos permite pensar demais, sem que os olhos se
fechem, indica que nossas nuvens insistem em chover no mesmo terreno exaustivamente,
até a última gota, como se não soubessem viajar e encontrar terra seca. E tem
aquelas noites em que dormimos sem realmente descansar. Estranhos tempos estes,
em que sonhar virou tarefa para se fazer acordado, mas limitada aos intervalos
de outras atividades.